segunda-feira, 21 de abril de 2008

Sitema ético Skinneriano

A lógica do sistema ético skinneriano (Skinner, 1971) está intimamente ligada à do modelo de seleção do comportamento por conseqüências (Skinner, 1981/1984). De acordo com esse modelo, o comportamento humano só pode ser integralmente compreendido a partir da conjugação de variáveis atuantes em três diferentes níveis seletivos: filogenético (evolução das espécies), ontogenético (evolução de indivíduos particulares de uma espécie durante seu tempo de vida) e cultural (evolução das culturas). Isso inclui o comportamento ético, verbal e não-verbal.Para Skinner, bens éticos são conseqüências do comportamento. Nos três níveis seletivos (filogenético, ontogenético e cultural) o comportamento produz certos efeitos, e é através destes efeitos que os problemas éticos devem ser analisados. O sistema ético skinneriano descreve três tipos de bens (1971). Bens pessoais são reforçadores positivos em relação ao comportamento da pessoa que os produz. Cabe destacar o adjetivo positivos, pois reforçadores negativos são o oposto de bens pessoais (Skinner, 1971). Bens dos outros são aqueles que, ainda que produzidos por certo indivíduo, resultam em reforçamento positivo para o comportamento de outras pessoas que não o próprio indivíduo. Também estaremos agindo eticamente, nesse caso, ao remover reforçadores negativos em relação ao comportamento de outros. Bens das culturas são todas as conseqüências de práticas culturais que contribuem para a sobrevivência da cultura que promove tais práticas. O comportamento ético de qualquer ser humano define-se por sua relação com a produção desses três tipos de bens, que não é mutuamente exclusiva - isto é, uma pessoa pode, através de certa ação, produzir não apenas um, mas dois ou três tipos de bens simultaneamente.

Analisando conjuntamente o sistema ético skinneriano e o modelo de seleção por conseqüências, conclui-se que comportamentos eticamente bons são todos aqueles que "satisfazem" às contingências seletivas. Note-se que Skinner (1971) classifica como bens exatamente aquelas conseqüências que promovem a seleção do comportamento nos três níveis especificados. Entretanto, conforme veremos em seguida, não há perfeita simetria entre os três níveis que compõem, respectivamente, o modelo de seleção por conseqüências e o sistema ético skinneriano, dado que: 1) bens pessoais não incluem apenas reforçadores primários, mas também secundários; 2) bens dos outros são produzidos apenas sob circunstâncias especiais de seleção do comportamento operante no segundo nível. No primeiro nível, o comportamento é selecionado se contribui para a sobrevivência da espécie à qual pertence o indivíduo que se comporta. As conseqüências imediatas desse tipo de comportamento (alimento, sexo, segurança) adquirem, para certas espécies, propriedades reforçadoras. A estas conseqüências denominamos reforçadores primários, ou incondicionados, que são os principais bens pessoais, derivando destes reforçadores todos os demais bens pessoais - i.e., os reforçadores secundários, ou condicionados. No segundo nível, um operante é selecionado se produz reforço. As conseqüências reforçadoras que selecionam operantes - i.e., os bens pessoais - são, em sua ampla maioria, mediadas pelas pessoas com quem convivemos. Para que tenhamos acesso a tais conseqüências, temos que produzir bens para estas pessoas (os bens dos outros).

Daí a explicação para o comportamento em benefício alheio: trata-se de reforçamento recíproco. Nas culturas humanas, a produção de bens para outros surge quase sempre como um pré-requisito para a obtenção de bens pessoais - e o próprio fato de que produzimos bens para outros só se justifica nesta medida. Finalmente, no terceiro nível, uma prática cultural é selecionada se contribui para a sobrevivência da cultura que a mantém. A conseqüência de práticas desse tipo é a própria perpetuação da cultura e das práticas que a compõem..............Entretanto, há que se notar o seguinte: não é Skinner quem está, a partir de julgamentos pessoais, qualificando esses comportamentos e suas conseqüências como bons. Ele está, em princípio, tão-somente descrevendo contingências naturais e culturais de seleção do comportamento por conseqüências. É evidente, no entanto, que essa descrição é realizada a partir de uma matriz teórica, e o conceito de descrição não alude, por conseguinte, a uma realidade "objetiva". Skinner não está ordenando, pedindo ou exortando para que trabalhemos por nossa sobrevivência biológica, ou para que busquemos produzir conseqüências reforçadoras para nós mesmos ou para outros, ou para que trabalhemos pelo futuro de nossas culturas. Isso tenderá a ocorrer a despeito da vontade de Skinner ou de qualquer outra pessoa. Há exceções, é claro, mas as contingências seletivas tendem a mantê-las em baixo número: espécies cujos membros não trabalhem por sua sobrevivência biológica tendem a extinguir-se, o mesmo ocorrendo com operantes que não produzam reforço e com culturas que não se ocupem de seu futuro. Assim, o que é "ético" tende a ser selecionado; o que é "antiético" tende a desaparecer. Porém, isso não leva, como pode parecer, ao domínio absoluto do "ético" sobre o "antiético"

O princípio básico da seleção enquanto modelo de causalidade (a permanência do que é bom e o desaparecimento do que é ruim) constitui uma simplificação conveniente de processos extremamente complexos. A evolução jamais alcança uma estabilidade caracterizada pela permanência exclusiva do que é bom. O próprio conceito de seleção só se justifica em um quadro de referência constituído tanto por comportamentos bons quanto ruins - dado que, se todos os comportamentos fossem bons, todos seriam selecionados. Nesse caso, obviamente, o conceito perderia seu sentido. Além disso, um princípio amplamente aceito pelos teóricos da evolução filogenética encontra correspondência também nos demais níveis seletivos: os organismos, durante sua evolução, perseguem um "alvo móvel"; isto é: o que é bom hoje pode não sê-lo amanhã - e a própria mobilidade deste alvo é, em grande medida, determinada pelo comportamento do organismo que o persegue (Lewontin, 1998/2002, p. 63).